Os seres humanos sempre tiveram um desejo universal de alterar estados de consciência, ao longo da história.
Um estudo realizado pelo especialista Michael Pollan aponta que, na maioria das culturas ao redor do mundo, 99% alcançaram estados alterados através das plantas.
Com a Guerra às Drogas, algumas substâncias que crescem livremente no meio-ambiente foram alvo do proibicionismo.
Portanto, a relação entre seres humanos e a natureza que causa alterações de consciência sempre foi complexa, mas parece estar ganhando novos contornos.

Michael Pollan é um escritor que estudou, por 30 anos, a relação da humanidade com as plantas.
Como elas moldaram nossa evolução e como nós moldamos a evolução delas, através da domesticação.
Em seu livro, ”This is your mind on plants” (Essa é sua mente com plantas, em tradução livre), Pollan foca em três substâncias psicoativas, encontradas na natureza, que moldaram a sociedade: cafeína (do café), ópio (da papoula), e mescalina (encontrada nos cactos Peiote e San Pedro).
O vício na cafeína
Se levarmos ao pé da letra que droga é qualquer substância que causa alterações no nosso organismo, podemos dizer que a maioria da população mundial é ”drogada”, já que 90% consome café diariamente, e boa parte é dependente de cafeína.
A cafeína nos deixa mais alertas e proporciona foco.
Pollan realizou um experimento para seu livro, em que ficou três meses sem consumir café. Ele relata que diversas alterações aconteceram em sua mente e corpo, principalmente fazendo-o sentir com uma falta de identificação com ele mesmo e com a realidade.
A conclusão de Pollan foi que ele – e a maior parte das pessoas – depende dessa planta, o café, para se sentir ele mesmo. E o que acreditamos ser nossa realidade normal, na verdade, pode ser uma realidade alterada pelo café.

Os ensinamentos da mescalina
A mescalina é usada há mais de 6.000 anos por povos indígenas nativos de regiões do continente americano.
Devido ao proibicionismo, o potencial desse alcalóide nunca foi verdadeiramente explorado pela sociedade moderna. Só agora parece que estão aprendendo o que povos nativos já sabem há muito tempo: essas substâncias são ferramentas poderosas de cura.
Esses conhecimentos milenares são extremamente importantes para a sociedade atual, principalmente no sentido de que a maioria dessas substâncias deveriam ser usadas com um propósito.
E parece que a comunidade científica e médica estão começando a entender isso.
Estamos observando um movimento com os psicodélicos nesse sentido, de usar substâncias que causam alterações de consciência para a cura e para a saúde mental.

Ópio
O ópio é uma das substâncias mais fáceis de se obter, antes da papoula florescer, são feitos cortes na cápsula da papoula, quando ainda verde, obtendo um suco leitoso, o ópio (a palavra ”ópio” em grego quer dizer suco).
Com isso, você pode fazer chá, narcóticos (heroína) ou remédios (opióides). A diferença entre um produto e outro é a criminalização.
Durante a Guerra às Drogas, qualquer um que possuísse uma plantação da papoula poderia ser preso por crime federal.
Uma situação bastante similar à da maconha: se crescer no seu quintal (ou seja, na natureza) uma planta de maconha, você pode, simplesmente, ser preso.
Ainda sobre a papoula: apesar do ópio ser proibido, a indústria farmacêutica tinha pleno aval do governo para produzir os opióides em larga escala, o que acabou desencadeando uma forte crise em diversos países.
Pode parecer irracional a natureza ser criminalizada, mas é o que acontece.
Descriminalizar a natureza
Existe um movimento nos Estados Unidos chamado ”Decriminalize Nature” (descriminalize a natureza), que divulga informação sobre plantas enteógenas e psicoativas, e busca a descriminalização de todas as plantas com potenciais terapêuticos, que são proibidas.
A verdade é que essas substâncias estão presentes na natureza e não há motivo para mantê-las proibidas.
Desde que haja orientação sobre os usos e se entenda o propósito do consumo, essas substâncias naturais têm muito a nos oferecer.
Por milhares de anos, quase a totalidade das substâncias que causam estados alterados de consciência são provenientes (ou derivam) da natureza: café, álcool, tabaco, cocaína, heroína.
O status de ilegal é que carrega os efeitos colaterais: você não sabe a procedência do que está consumindo, não tem informação adequada sobre como consumir e não consegue aproveitar o real potencial dessas substâncias psicoativas naturais, por serem proibidas.
Fonte: Vice